sábado, 10 de dezembro de 2011

Peça de Natal: A Manjedoura e a Estrela.

A Manjedoura e a Estrela.

ESTRELA (arrogante) —
Eu moro nas alturas consteladas e ando por entre as gázeas nebulosas, no éden, onde as estrelas são as fadas de longas cabeleiras luminosas. A via - láctea é o tálamo argentino onde derramo toda a minha luz... — Iluminar o céu é o meu destino, pois para isso na amplidão me pus. Nem águias, que transpõem cordilheiras, atingirão jamais onde eu habito, porque, cheias de tédios e canseiras, jamais penetrarão pelo infinito... Estrela — sou na etérea imensidade, a fulgura janela de cristal por onde espia Deus, da eternidade, o mundo cheio de tristeza e mal.
E tu, quem és, humilde Manjedoura, para que contes toda a tua gloria? Hás de pensar: eu sou imorredoura, pois não tem fim a minha trajetória...


MANJEDOURA (humilde, permanece abaixada e de cabeça baixa) —
Eu nada valho diante de uma Estrela, que enche o infinito todo de clarão, porém, não sendo eu fulgurante e bela, a minha glória não é sem razão — Vivo na terra, habito com a pobreza e nada sei da tua formosura; sou palha seca, seca e sem beleza, e só o pobre pária me procura. Os bois, que mugem ao cair do dia, buscam-me sempre com satisfação, porque o meu feno a fome que os crucia vai-lhes servir de abençoado pão... Não sou de Deus janela, como dizes ser entre os astros todos do infinito, mas os que vem a mim são mui felizes e de alegria soltam o seu grito. Isso me satisfaz, é a minha glória, se não clareio o céu, que quero mais? Cheia de ilustrações é a minha historia, mais bela que a dos mundos siderais!

ESTRELA
Não creio no que dizes, és fálace e, arrependida, a fronte não inclinas... Que seria do mundo, se faltasse o brilho das Estrelas peregrinas?

MANJEDOURA
Embriaga-te o fascínio das alturas e muito grande tu desejas ser, mas, apesar de tudo, não procuras um caso extraordinário me dizer!...

ESTRELA
Pois ouve lá: Ha séculos passados, quando guerra no mundo não havia, de entre outros Astros de clarões dourados, que transformam a noite escura em dia, fui escolhida, pelas mãos divinas, para desempenhar uma missão de procurar ao longo das campinas a do Messias pobre habitação.
Tomei o meu diadema luminoso e, de lampejos novos me vestindo, tornei o espaço mais esplendoroso. E nesse dia o céu ficou mais lindo.
E, cheia de fascínio, caminhando traves do atapetado céu, parti, o berço do Messias procurando, do Cristo cuja face inda não vi.
Errei pela amplidão da Palestina, como quem busca para si tesouros, como quem o seu nome não declina quando a vitoria aos pés lhe atira os louros.
Depois olhei no engaste azul celeste para escutar dos anjos as canções e embaixo vi Belém, de humilde veste, sorrindo para todas as nações...
Jesus nascera, o Salvador do mundo, cuja choupana iluminei, radiante, ele na terra, em seu fulgor profundo, eu a fulgir no páramo distante!
Tiveste tu a glória sublimada de, sobre a casa onde Jesus nasceu, brilhar — opala grande e iluminada — como naquele dia brilhei eu?

MANJEDOURA
Somente tu, Estrela fulgurante, brilhaste sobre o teto do Messias, mas não estavas tu no céu distante, como ver ao menino poderias? Foste menos feliz do que eu, no entanto, porque não contemplaste o Salvador, teu orgulho dos cimos era tanto que nem pudeste ver o bom Senhor! Pois eu vestes não tive aparatosas, nem me enfeitei de contas de esmeraldas, nem o meu solo atapetei de rosas, nem ostentei coroas e grinaldas, para, naquele dia memorável, ouvir dos anjos as canções sem fim, porque, sendo eu humilde e miserável, o Salvador nasceu dentro de mim! Fui eu quem teve a dita sublimada de receber a criança no regaço, quando, naquela noite iluminada, brilhaste no zimbório azul do espaço; fui eu quem, ao abrir no infinito os olhos abrasados pela luz, sorriu na terra para o peito aflito, no primeiro sorriso de Jesus!

ESTRELA — Tu tens razão... Adeus! Onde cintilo, pairam as nuvenzinhas cor-de-rosa, e inda percebo ouvir no céu tranquilo as melodias da harpa sonorosa... Adeus! Adeus! O espaço me convida e eu devo alar-me para os céus azuis; vou procurar em Cristo a eterna vida, pois vida eterna só há em Jesus!

MANJEDOURA (sozinha) —
Nasceu Jesus! Hosanas nas alturas
E paz na terra aos homens que Deus ama!
Vibrem de gozo todas as criaturas,
Porque do céu perfume se derrama
E a terra toda se enche de alegria
Para aclamar Jesus, o sumo bem,
O Rei nascido numa estrebaria,
Na manjedoura humilde de Belém.
  
Livro: Florilégio Cristão.